quarta-feira, 6 de maio de 2009

como eu queria virar nuvem...

e sou tão absurda
quando jogo comigo mesma!

mas inventar alguma coisa
daria uma tonalidade audaz
nesse quadro inanimado:

o branco incendeia
o breu da noite atormentada
a cada linha delineia:

anjos de asas e armaduras
adornam vielas com casinhas acesas
as janelas, os segredos

(que nem são segredos,
mas não tenho acesso)

liláses, vermelhos, arredores
"Rosa-e-Azul"

montanhas, pincéis, crianças, nus ...
Renoir, Van Gogh, Monet, Degas ...

Estranha

Há um silêncio
que finjo não ouvir

que cala em nó
embrulhando meus dias

Dessarte, iminente,
o peso e o oco

nas páginas vazias,
alguns vestígios

inquietantes

"Mulheres Nuas"

minha poesia exposta
sob vidro frio, jazia

queria silêncio e gaveta
(tão desconhecida!)

ou antes o vento
a chuva, relento

minha poesia exposta
era estranha e abandono

um cão sem dono
dou-me

naturalmente

ando tomando umas medidas:
em vez de ficar pensando em você
aceitei um convite para um café

e hoje aceitei um convite para um café!!! (outro)

acho que está dando certo
a questão da substituição...

motivo

não direi o óbvio de mim
(quando sou feita de excessos)

sempre a enchente me cobrindo
afogamentos quase completos

e nada que valha

Poesia

passou a manhã olhando pela janela:
sol
nuvens
mais nuvens
sol
fome

a tarde olhando pro chão

à noite mudou de posição

Não direi insanidades

o sol é cenário
a noite é cenário
enquando o mundo brinca de roda

Caderninho

Ando quieta
compenetrada

não imagino o que me tiraria deste sério

porque tem hora, que nem o sonho tem mais ilusão



.

Diálogo mudo

Muito antes que venhas me dizer:
pressinto

...muito antes, tua palavra perderá o sentido
e nada me dirás...



.

Não sou pessimista, mas viver de encarar as coisas como são causa alguma frieza,
que até se parece com algum desânimo...



.

Não creias no que digo
nisso eu creio, já basta!
assim tua crença fica intacta




.

talvez doesse menos meu estômago
se eu pensasse menos
se eu sentisse menos
se eu esperasse menos

preciso urgente fazer uma dieta



.

perdi o interesse
prefiro me livrar das vestes velhas e seguir nua



.

Cinzas

da labaredas que queimaram Joana
imagino um burburinho
e alguns estalos partindo seus ossos
pra me livrar um pouco ao menos de meus mais.



.

o calvário da consciência lúcida
procura o cimo
um sabão em pedra
e um tampão para os olhos

Minha Vila Madalena

Minha Vila Madalena
Enquanto as ruas me atravessam
passo a passo, sem pressa,
grafites, frases, muros,
rastros, bares, murmúrios,
um vendedor de rosas,
toda prosa,
na Fradique Coutinho,
diz que plástico não morre,
nem riso que nasce molhado
da pétala fresca dos lábios
da moça que anda sozinha,
diz que sabe poesia,
diz de um dia que chovia
e vai dizendo,
enquanto rumo ao encontro,
de quem ainda nem conhecia,
no estacionamento,
a minha espera,
na Livraria.

Sob meu olhar

Dias e dias
em convívio recluso
limite, fobia

falei ao avesso
pensei inconsequente:
pipas, balões, aviões

desenhos em papel de seda
papéis de parede, rede
noites insones

Nina Simone

contrastes
na página de hoje
marca-dor

pedaços do passado
espelhos estraçalhados
um corte na mão

amadora

Delírios

Estou pronta
com uma raiva rondando
um ataque
atabaques (palavrinha oportuna)
um bote
e castelos caem

Sonho de Março

Dormir
povoar a noite de sonhos fragmentados

perdi uma criança
de vista
perdi a hora
e um compromisso
esqueci a senha
e chorei
pelo que escapou por esquecimento

cobrou a dor no peito
o dia já pelo meio
o passo que não alcançou
a hora passada
a frustração
a impotência
o sonho perdido

o caos
reflexo do meio
perdi o ponto
balanço

explicações desconexas
desculpas de paz

aos teus pés
angústia
a passagem impressa
jogo de palavras
decolagem
mais um vulto entre transeuntes
inconfessável
incontestável

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Resvala da luz


a metade
que em mim se cala

é Holocausto
fogueira
cruz

dedos que estraçalham





*Marcelo Farias dedicou este poema ao seu amigo Jotta, assissinado em Manaus em Maio de 2009

Choque

vagar em noites,
seguir ciente das ciladas
o riso da boca para fora

no rosto, um véu mascara

não vanglorio
sei da minha miséria
das pétalas,
da flor ainda semi-aberta,
secura

é curto o ciclo...podia deixá-lo cumprir-se

tão silenciosa a margem em que me debruço
chove sem mais sonhar a estiagem
vertente que não se esgota
vertigem constante

essa que vês, se faz camaleão e sua cor é palidez
um dia ousou o sonho,
hoje a frieza
não diria jamais que voluntária

minha ousadia precede o que quero