sábado, 19 de setembro de 2009

Entremeio

Espanta-me a abundância
quando dela se sabe: inefável

hoje fez sol!
eu vi através do vidro
e gelei quando fechei os olhos recostada à parede do quarto

o sol me desafiou logo cedo

eu,
sem luz,
embriagada há séculos,
tive um momento de lucidez

domingo, 6 de setembro de 2009

a vida não tem mesmo jeito...




às seis da manhã, quando distribuem os jornais pelos andares, ouço o ruído do elevador que se movimenta e para, se movimenta e para. isso não impede que eu durma em seguida, quando esse trabalho termina. acordarei novamente quando a campainha do colégio em frente ao prédio tocar às 7:30, o que também não impede que eu volte a dormir depois. ando pensando em algo que me induza ao sono, ando querendo não pensar, ando querendo acordar daqui há algum tempo, quando já não mais estiver aqui. chorei.
o interfone tocou, esperei que tocasse mais algumas vezes, para ter certeza que havia tocado mesmo. a voz que chamava, o nome. pedi ao porteiro que repetisse e ele disse o nome e o codnome. da sacada do vigésimo andar, vi duas mãos segurando o portão, como a querer abri-lo à força. não. preciso dormir. olho no espelho e não gosto nada do que vejo. volto para cama. mas se fosse alguma emergência? - mulher é assim, não consegue dizer um não e ficar despreocupada - não. vou dormir. não durmo. ligo para o celular:

- aconteceu alguma coisa?
- vem tomar café comigo?! - desliga o celular. põe no bolso do paletó do terno. vi da sacada. volto para cama. durmo. meia hora? o interfone toca novamente. peço que espere um pouco. tomo banho, um creme no rosto. um jeans e a primeira blusa que encontro...
- o que houve?
- vim te ver. vamos tomar café na padaria?...

curioso como há momento em que se congela o pensamento, o corpo segue como que automatizado...

- cerveja? passou a noite em claro? ainda não foi para casa? pra mim café .
- a vida não tem mesmo jeito. ele disse olhando em meus olhos, como se essa fosse a conclusão de algo muito pensado e repetiu - a vida não tem mesmo jeito...

há um ano atrás parecia muito certo de seu rumo, pensei. mas eu sei que nada nesta vida é tão certo assim.
segurou minhas mãos e pela primeira vez senti que estava diante de mim tudo o que desejei daquele homem, tudo que duvidei que um dia ele tivesse coragem de demonstrar...

...no caminho de volta, ele me abraçou e caminhamos assim em silêncio...até o portão.
o sol ofuscava minha vista, eu reparava em sua pele clara do rosto algumas sardas espalhadas, enquanto seus olhos continuavam nos meus. ofereceu-me a face que beijei com carinho...ele se foi...

sobre o que falamos? quase nada foi dito... nem foi preciso
Ivone fs


(quadro: Frida Kahlo)
" - "Arvore da Esperança, Mantém-Firme" (1946)
Frida Kahlo pintou este auto retrato para seu patrono, o engenheiro Eduardo Morillo
Safa, depois de uma operação. Na mensagem "Arbol dela Esperanza Mantente Firme.",
que está escrita na bandeira, ela parece procurar alento. A expressão foi retirada de uma das suas canções preferidas. " obrigada, Carmen Sodré,pela informação!