domingo, 18 de abril de 2010

no que te tornas

ainda que te roubem o sorriso
numa repulsa te vomitem vermes

ainda que por um instante te fizerem crer
de um passado, um retrato abissal
de um presente, o que dele restou: ( )

ainda que sentidos sobressaltos em altas doses
irreversível o retoque, se já in-trincado

ainda que falte o chão
ainda que falte o ar
ainda que falte a fala
ainda que falte o verso (porque és poeta!)

e em nenhum lugar te encontrares
e nenhum lugar te sobrar

hás de te consolares, pois de ti não partirás

quarta-feira, 14 de abril de 2010

febril

sinto nos olhos
cinzas
lágrimas correm mais quente neste estado
o silêncio ensurdece num funil
a gente perde a postura
qualquer coisa a fazer
um chá
a muda de roupa para dormir
demaquilantes
creme anti age
ataduras

vou dormir no sofá enquanto crio coragem

Num mesmo tempo (para Maitan)

Num mesmo tempo (para Maitan)
em mim você nasce:
que manhã não há de ser nova?

se essa voz é sua, ouço
ouço sua voz
e escalo

pra ouvir mais de dentro...

a essa altura,
nem uma palavra mais

sob a pele [à flor da pele]

quero tua voz
minha boca entreaberta
meu olhar ligado
no teu

quero o mundo inteiro calado
o momento congelado
as aflições perdendo o medo

Quero um sorriso jogado no nada
meio tímido atrelado
a um suspiro
um alívio
um delírio

quero não dizer nada
ouvindo teus gestos
colhendo os segredos
livremente encarcerada
como sonhar acordada

a história inventar

na saudade
sob a pele [à flor da pele]
no galope sucessivo
o tempo

ah, não corres o risco

na saudade
sob a pele [à flor da pele]
seras de novo

(Ivone fs)


* é música(?) me inspirei num video do Chico Buarque e Milton Nascimento "O que será" (À flor da pele)

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Fim de tarde

estive serena
e descobri coisas
um leão cochilando é um cordeiro
um vacilo mata mais rápido que um leão
descobri que ninguém detém doçura e gentileza vinte e quatro horas seguidas
há reféns e fingem
e peso e custo e explosões e apelos
descobri que ódio e inveja são sempre provocados e não há veneno que os extermine
há tréguas banimentos nunca o esquecimento
descobri a escravidão da bondade
submissão
e há outra bondade
essa é rainha tirana
descobri a sensação de ser meio
passagem
quando lambem sua língua com a saliva do diabo pelo próximo degrau
descobri obviedades
e não há quem se salve
só amo quem me ama
e não tolero os covardes
admito os fracos
que não suportam ser menos
porque são
sempre comem na mão
e sobre os altivos
não tenho qualquer palavra
é muita vastidão
dá vertigem